Por Bob Vieira da Costa
A evolução do consumidor é marcada pelo crescente poder que ao longo do tempo foi sendo conquistado graças, principalmente, à evolução da tecnologia, que evidenciou a competitividade global, e pelo seu natural processo de amadurecimento, com a crescente consciência de seu valor ao ser cada vez mais disputado.
Das primeiras fases, onde tudo era feito sob medida por falta de opção, aos tempos em que se podia escolher a cor do carro desde que fosse preto, houve uma profunda transformação nos mercados até os dias atuais, onde se customiza computadores, vestuário, automóveis e cosméticos como forma de buscar a diferenciação definitiva para o “eu” consumidor.
Ao mesmo tempo, os avanços na tecnologia na área da informação disseminaram o conhecimento e apoderaram consumidores com muito mais capacidade de comparação, mobilidade e instantaneidade, tornando-o senhor de todos os processos e juiz final na avaliação de marcas, produtos, serviços, lojas e canais de vendas e relacionamento.
“A comparação instantânea de alternativas cria um consumidor cada vez mais volúvel e predisposto à experimentação e seu apego às marcas, locais e canais de compras é permanentemente desafiado pela gratificação eventual do novo.”
Assim evoluímos até os Neoconsumidores, aqueles que são cada vez mais digitais, multicanais e globais nos seus padrões de consumo e desejos e que crescem em sua participação de mercado na mesma velocidade em que a internet, os celulares, smartphones e tablets avançam para se tornarem dominantes no dia a dia das pessoas e, para as novas gerações, uma extensão do corpo.
Nessa evolução, caminhamos para o aumento também da participação dos Metaconsumidores, aqueles dentre os Neoconsumidores que buscam, além dos produtos e serviços, o compromisso das marcas e das corporações com a sustentabilidade, percebido como caminho sem volta em especial pelas novas gerações em todo o mundo.
Todo esse processo desencadeou uma profunda e estrutural transformação no mercado onde a referência de produtos, marcas, lojas e serviços é cada vez mais aquela feita por outros consumidores e cada vez menos pela comunicação oficial, desafiando empresas a se relacionarem de forma positiva para gerar empatia, reconhecimento e adesão.
A comparação instantânea de alternativas cria um consumidor cada vez mais volúvel e predisposto à experimentação e seu apego às marcas, locais e canais de compras é permanentemente desafiado pela gratificação eventual do novo. Um cenário onde a hiperconveniência, demandada por uma vida mais atribulada e de tempos cada vez mais escassos, nos torna mais apegados ao que é mais próximo, simples e fácil, por paradoxal que possa parecer.
Vivemos um quadro onde a própria competitividade precipita a concentração corporativa da oferta, porém com multiplicação de marcas e alternativas, que deveriam deixar consumidores cativos das grandes corporações globais, mas cujo efeito é contrário; pois a competitividade disseminada coloca ainda mais poder nas mãos dos consumidores..
É um cenário onde existe um amplo processo de troca de papéis, com a indústria cada vez mais presente diretamente no varejo, inclusive digital, como Apple, Nike, Nespresso e muitos outros, o que cria ainda mais alternativas na disputa pelo consumidor. a varejo se transforma em desenvolvedor de produtos e gestor de marcas, nos mais diversos canais, seja em empresas do mercado global como Zara, H&M, Tesco, Carrefour, Walmart, ou do mercado interno – Pão de Açúcar, Riachuelo, Renner, C&A e Marisa. Todas estão em busca de gerar mais opções, cada vez mais segmentadas e específicas, a partir da possibilidade de monitoramento do comportamento e desejos do “eu” consumidor.
São tempos em que as possibilidades geradas pela tecnologia para acompanhar os padrões de consumo, identificar comportamentos, desejos e rejeições, colocam os detentores dos meios necessários para administrar esse comportamento numa situação privilegiada para adequar a oferta de produtos, marcas, preços e promoções aos desejos’ e vontades do “eu” consumidor.
O conjunto dessas transformações fez emergir um consumidor mais conectado, irreversivelmente mais informado, mais determinado, mais disputado, mais consciente, mais crítico, mais aberto a expressar seus agrados e desagrados e, crescentemente, mais difícil de ser entendido e atendido, por mais recursos que sejam alocados para isso.
Nessa complexa equação redesenhada, estranhamente se tem desconsiderado, em especial nos mercados mais maduros e desenvolvidos, que o melhor e mais efetivo elemento de interação com o “eu” consumidor é o ser humano, o único que tem condições de entender, aprender, responder, interagir e se relacionar de forma adequada e, se possível surpreendentemente positiva, para gerar o correto nível de satisfação. E muito investimento tem sido feito em tecnologia, sistemas de informação, processos, telefonia e outros recursos mais, buscando “desumanizar” as relações, em busca do improvável equilíbrio entre menores custos e máxima satisfação, redundando em crescentes níveis de frustração.
Neste contexto, as redes sociais se tornaram a mais complexa e indomável opção de expressão para os “eu” consumidores e ao mesmo tempo, o testemunho de como numa era de hiper-comunicação as pessoas se sentem sós e buscam relacionamentos, referências, contatos e diálogo, o que tem sido pouco compreendido pelas corporações e pelas marcas.
Nessa escalada de complexidade talvez o mais simples raciocínio seja a constatação que o desafio de decifrar ou ser devorado pelos “eu” consumidores está mais na capacidade de saber ouvir e perguntar, para entender, do que no poder de falar e comunicar.
Marcos Gouvêa é diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza
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